O Dia Nacional de Combate à Discriminação Racial é celebrado em 3 de julho e tal data faz alusão com a primeira lei criada no Brasil contra o preconceito racial, a Lei Afonso Arinos, n.º 1.390/1950.
Apesar da referida lei tratar tão somente de situações envolvendo a recusa, por parte de estabelecimento comercial ou de ensino de qualquer natureza, de hospedar, servir, atender ou receber cliente, comprador ou aluno, por preconceito de raça ou de cor, tem-se que, sob o viés legislativo, foi o pontapé inicial para a luta incessante pela igualdade.
É terminantemente proibido tratar o outro de forma desigual tão somente em razão de sua raça. Além de violar o princípio da igualdade constitucionalmente protegido, viola, ainda, os objetivos da sociedade tal como reza o Artigo 3º, inciso IV, da Constituição Federal.
Contudo, embora mais da metade da população brasileira seja composta por negros, conforme pesquisa realizada pelo IBGE, ainda nos deparamos com vários episódios racistas, os quais, se ocorridos no ambiente laboral, deverá ser rechaçado pela política antidiscriminatória da empresa.
É importante que esta prática institucional de mau agouro seja combatida pelas regras previstas no programa de compliance.
Política antidiscriminatória
O racismo, além de ser um crime inafiançável e imprescritível, é inadmissível e intolerável na nossa sociedade e sua existência apenas demonstra o longo caminho da evolução que ainda precisamos percorrer.
Vivemos em uma sociedade em que o racismo estrutural ainda convence de que é natural haver apenas brancos em cargos de liderança. Conforme o CAGED somente 20% dos cargos de liderança são ocupadas por negros e isso é, sem sombra de dúvidas, reflexo do racismo estrutural que afeta deliberadamente o mundo corporativo.
É diante deste cenário que o compliance antidiscriminatório deve ganhar força não só para promover e incluir grupos minoritários e vulneráveis na organização, mas, também, para o comprometimento com o “S” do acrônimo ESG. O Decreto 9.571/2018 estabelece diretrizes nacionais sobre empresas e direitos humanos e incumbe às organizações dos deveres de combater a discriminação nas relações sociais e de promover a diversidade e inclusão, além de ser dever identificar os riscos de impacto e de violações a direitos humanos no contexto de suas operações e adotar mecanismos de precaução, controle e reparação a violações eventualmente ocorridas.
Vale ressaltar que a Security Exchange Commission (agência independente dos Estados Unidos) obriga que as empresas listadas na NASDAQ promova a diversidade nos cargos destinados ao Conselho da Administração. Ainda que não preveja, expressamente, a nomeação de negros para tais cargos, evidencia-se um avanço importante no regramento americano a este respeito.
Uma política antidiscriminatória está diretamente conectada ao 10º pilar do compliance – diversidade e inclusão – e, comprovadamente, impacta de forma positiva na reputação da empresa, gerando maior visibilidade de mercado e, consequentemente, maior receita.
Implementar uma cultura de diversidade e antidiscriminatória na empresa contribui para a saúde do ambiente laboral e reduz conflitos entre funcionários e colaboradores, além de motivar o respeito pelo ser humano independentemente de sua raça, religião ou opção sexual.
Intolerância ao racista
O programa de compliance antidiscriminatório deve prever as penalidades decorrentes de qualquer ato de racismo, principalmente, porque não se trata de um simples ato, mas sim de um crime passível, inclusive, de prisão.
Desta feita, é importante asseverar que até mesmo um post publicado por um funcionário em rede social poderá ser objeto de análise pelo compliance e pelo RH, principalmente, quando a empresa prega a cultura antidiscriminatória e possui princípios e regras claras a este respeito no Código de Ética.
Tal análise pode não configurar invasão de privacidade ou extrapolação do poder diretivo do empregador, posto que as opiniões dos colaboradores em redes sociais por vezes é confundida com os valores e princípios da empresa afetando diretamente os negócios. Ademais, a partir do momento em que o funcionário deu publicidade à sua imagem e opinião deve ele suportar os riscos dai decorrentes, principalmente, quando se está diante de um crime.
Neste sentido, evidencia-se que um ato racista, ainda que praticado em rede social, pode ensejar aplicação de penalidade pela empresa ou até mesmo demissão por justa causa, amparado no Artigo 482, alínea b, da CLT.
A sociedade, não raro, exige o posicionamento da empresa diante de eventual ato racista, tal como já ocorreu com o canal BBC ao demitir Danny Baker por ter compartilhado comentário racista sobre o filho recém-nascido do príncipe Harry com a duquesa Meghan; com a maior fabricante de cosmético, Estée Lauder, ao demitir o executivo John Demsey ao publicar um post contendo insultos raciais e piadas sobre a Covid-19; com a empresa de treinamento funcional, Studio Vitória, ao demitir Lucas Almeida pela postagem com conteúdo racista; com a Seara Alimentos ao demitir Herman Leonardo em razão de comentário racista sobre o cabelo do participante João no BBB21.
Isto posto, tem-se que o compliance se torna imprescindível na luta antirracista, promovendo a igualdade, o respeito e a reformulação do olhar corporativo acerca da diversidade racial.
Referências:
TARDELLI, Eduardo. Qual é o papel do compliance na luta antirracista? EXAME. Outubro/2021. Disponível em: https://exame.com/bussola/qual-e-o-papel-do-compliance-na-luta-antirracista/ Acesso em 5/7/2023.
ÁVILA, Ana Paula. ESG, compliance e combate ao racismo. MIGALHAS. Agosto/2022. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/depeso/371341/esg-compliance-e-combate-ao-racismo Acesso em 5/7/2023.
VEIGA, Gisa. Empresa dispensa empregado por comentário racista em rede social contra João do BBB 21. AMATRA. Abril/2021. Disponível em: https://www.amatra13.org.br/noticias/empresa-dispensa-funcionario-por-comentario-racista-em-rede-social-contra-joao-do-bbb-21/ Acesso em 5/7/2023
PLANALTO. Lei 1.390/1951. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l1390.htm#:~:text=L1390&text=LEI%20No%201.390%2C%20DE%203%20DE%20JULHO%20DE%201951.&text=Inclui%20entre%20as%20contraven%C3%A7%C3%B5es%20penais,de%20ra%C3%A7a%20ou%20de%20c%C3%B4r. Acesso em 5/7/2023
PLANALTO. Decreto 9.571/2018. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2018/decreto/d9571.htm Acesso em 5/7/2023
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